Efeméride (escritos enjeitados)
Foi há exactamente 78 anos que Jozé Marafado pediu a mão de sua vizinha Maria dos Prantos em casamento. A princípio, Maria não aceitou - só por brincadeira, para se fazer difícil, que nessa arte as mulheres já levam séculos de história e o amor desta mulher por este homem era o maior do mundo. Mas depois, perante a insistência de Jozé, Maria levou em frente a negação. Quanto mais Jozé perguntava «E hoje, já queres casar comigo?», mais friamente Maria respondia: «Não. Hoje ainda não».
Conta-se que, depois de se cansar da rotina do joelho-em-baixo-mão-no-coração, Jozé inventara, dia a dia, uma forma mais original de manifestar o seu amor. Mas por cada nova originalidade, Maria respondia com uma mais profunda frieza. E quanto mais fria, mais triste. E quanto mais não, mais nunca.
Os anos foram-se passando e, tantos anos depois, ainda Jozé Marafado perguntava, diariamente, «E hoje, já queres casar comigo?». E diariamente, Maria dos Prantos respondia «Não. Hoje ainda não». Mesmo que já ninguém, nem eles, se lembrassem do dia em que tudo começou. Nem do porquê da negação... Nem ninguém soube onde foi Maria dos Prantos buscar aquela gravidez. O pai podia ser incerto (um caçador estrangeiro, diziam uns; o padrasto, esse pulha, acusavam as más línguas; um princípe espanhol, suspiravam as crianças), mas os olhos eram de Jozé Marafado. Os olhos, o sorriso e a perseverança eram de Jozé Marafado. Seria? - inquirira um dia o prior. Ao que Maria dos Prantos respondera, friamente: «Só a noite sabe».
E todos os dias, até ao fim dos seus dias, Jozé Marafado pedia Maria dos Prantos em casamento. E todos os dias, até ao fim dos seus dias, Maria dos Prantos dizia «Não. Hoje ainda não». Mas todos os dias, até ao fim dos seus dias, Maria dos Prantos dava-lhe mesa, dava-lhe um tecto, dava-lhe cama e entregava-se-lhe todas as noites, até ao fim das suas noites. E quando Jozé, no silêncio escuro do cansaço, nos lençóis suados do amor, perguntava a Maria «já está farta de mim?», Maria respondia-lhe: «Não. Hoje ainda não».
Conta-se que, depois de se cansar da rotina do joelho-em-baixo-mão-no-coração, Jozé inventara, dia a dia, uma forma mais original de manifestar o seu amor. Mas por cada nova originalidade, Maria respondia com uma mais profunda frieza. E quanto mais fria, mais triste. E quanto mais não, mais nunca.
Os anos foram-se passando e, tantos anos depois, ainda Jozé Marafado perguntava, diariamente, «E hoje, já queres casar comigo?». E diariamente, Maria dos Prantos respondia «Não. Hoje ainda não». Mesmo que já ninguém, nem eles, se lembrassem do dia em que tudo começou. Nem do porquê da negação... Nem ninguém soube onde foi Maria dos Prantos buscar aquela gravidez. O pai podia ser incerto (um caçador estrangeiro, diziam uns; o padrasto, esse pulha, acusavam as más línguas; um princípe espanhol, suspiravam as crianças), mas os olhos eram de Jozé Marafado. Os olhos, o sorriso e a perseverança eram de Jozé Marafado. Seria? - inquirira um dia o prior. Ao que Maria dos Prantos respondera, friamente: «Só a noite sabe».
E todos os dias, até ao fim dos seus dias, Jozé Marafado pedia Maria dos Prantos em casamento. E todos os dias, até ao fim dos seus dias, Maria dos Prantos dizia «Não. Hoje ainda não». Mas todos os dias, até ao fim dos seus dias, Maria dos Prantos dava-lhe mesa, dava-lhe um tecto, dava-lhe cama e entregava-se-lhe todas as noites, até ao fim das suas noites. E quando Jozé, no silêncio escuro do cansaço, nos lençóis suados do amor, perguntava a Maria «já está farta de mim?», Maria respondia-lhe: «Não. Hoje ainda não».
Etiquetas: Escritos enjeitados
Eh lecas! este puxa-me pelo sentimento
Posted by rita maria josefina | 12:44
Ena pá. Confesso que verti uma lagrimita, oh camarada.
Posted by Rui Anselmo | 14:30
Eh lá: há tanto tempo que ninguém me chamava Lecas... nem camarada. Glad you liked it ;)
Posted by RS | 17:21