A viagem para a Costa Rica não se faz mal. Mas talvez se fizesse bem melhor se não fosse pela Iberia: a companhia espanhola tem o pior serviço, a pior comida, a maior falta de educação e civismo e as hospedeiras mais feias de toda a história da aviação mundial!
San Jose de Costa Rica é uma capital feia, mas cheia de vida. As ruas não têm nome: tirando a Avenida Central, todas as outras são numeradas e as ruas entre elas são uma incógnita.
Apesar de ser um país democraticamente estável e ecologicamente atento e de nem sequer ter um exército, ainda se encontram velhas palavras de ordem escritas pelos muros da capital. A mais marcante: «MAS POESIA. MENOS POLICIA.»
No meio de uma selva saída dos melhores filmes, Tortuguero é um género de paraíso na costa caribeña da Costa Rica. Para lá do calor abrasador e das melgas, há toda um manual vivo de ciências da natureza de um lado e outro da estreita península. Boas vistas e boa comida tornam o clima mais ameno.
Poucas imagens serão mais comoventes e reveladoras do que a de uma tartaruga com várias dezenas de anos, metro e meio e mais de cem quilos a pôr, pausadamente, dezenas de ovos, a tapá-los cuidadosamente no enorme ninho de areia e a voltar ao mar decidida, mas com a calma que o peso e a idade lhe exigem. Não é como ver uma cadela dar à luz uma ninhada de cachorros: é ver um dinossáurio prolongar a espécie sem olhar para trás, sabendo que sobreviveu a tudo, mas que dificilmente sobreviverá ao Homem.
E do outro lado, há macacos uivadores no topo das árvores, há preguiças a dormir, há crocodilos à espreita e um caimão mesmo à beirinha da água, há iguanas e lagartos de todas as cores, há lontras a caçar e manatins escondidos, há tucanos e anhingas e jacanas e tantas aves e não sei quantas borboletas e rãs impossíveis de contar, há um "Jesus Christ lizard" e um "Poison dart frog" e uma "Blue morpho", há animais a mais para caberem na memória e no cartão da máquina fotográfica...
Diz que os melhores restaurantes de Tortuguero são o Miss Miriam's e o Miss Junie's. Mas onde se come melhor é na Dorlings Bakery, na rua principal da aldeia - na única rua da aldeia...
O aeroporto de Tortuguero é o mais pequeno do mundo (um balcão, duas mesas, seis cadeiras e uma casa-de-banho) e parece saído de um filme de aventuras. O aeroporto abriu para o nosso vôo e quando o nosso pequeno autocarro com asas se fez ao ar, o aeroporto fechou.
Na Costa Rica só há duas estações: Verão e Verão com chuva.
Na estrada, são muitas as mensagens religiosas («Dios bendiga tu camino» é a mais comum). A caminho de La Fortuna há um lodge cristão e um resort israelita. À entrada da vila fica o Jehova Nissi Hostel.
Em todo o mundo, há Hard-Rock Cafés. Em La Fortuna, à sombra do vulcão Arenal, existe o Lava Rocks Café. E uma 'soda' chamada Chelas Bar.
O espanhol da Costa Rica perdeu os R's, vítima do excesso de americanos: o inglês é praticamente a segunda língua do país.
A viagem entre Arenal e Monteverde é belíssima mas uma aventura digna de Bruce Chatwin no Paris-Dakar: depois de 100 quilómetros de curvas em alcatrão esburacado, há mais 40 quilómetros de terra, lama, rochas e calhaus.
(...)
A via Panamericana é a única auto-estrada do país. São centenas de quilómetros de norte a sul da Costa Rica, com uma via para cada lado, muitos buracos e sem berma. Por cá, não seria sequer uma estrada nacional. Lá, é a melhor estrada, o percurso mais concorrido e também o mais lento e esfarrapado. Fazer 200 quilómetros na Panamericana é uma espécie de longo e fastidioso desafio.
A Costa Rica é um festim de personagens interessantes: Kurt, o alemão mais simpático de San Jose; Darryl, o canadiano biólogo, guia apaixonado e anfitrião competente em Tortuguero; o casal do Montana e as duas filhas, a meio de quatro meses de férias, que começaram com um mês a aprender espanhol; Roberto, o sueco filho de italianos que viaja pelo mundo de mochila às costas e câmara em punho; Jaime e Hugo, os dois irmãos, norte-americanos de Puerto Rico, aventureiros e com vistas largas (ao contrário da trupe de quatro norte-americanos muito "d'oh", saídinha de uma comédia teen de Hollywood); Adrian Mendez, guia, fotógrafo, artista e o homem mais contente do mundo ao descobrir um quetzal em Monteverde; Zack e Yuki, os estudantes (ele norte-americano, ela japonesa) que tomam conta do jardim de Borboletas; Beth, a sorridente norte-americana que trocou os States pela costa de Guanacaste e entrou no espírito das gentes (trabalha só às tardes e devagarinho)... Ah: para lá, a Cláudia Vieira; para cá, Gonçalo M. Tavares.
A viagem de regresso não se faz muito mal, porque se faz de noite. Mas decerto teria sido bem melhor se não fosse pela Iberia, eleita pela unanimidade dos passageiros com escala em Madrid como a pior companhia aérea de toda a história da aviação mundial. E Barajas, aeroporto a evitar para quem tiver de fazer escala em Madrid. A não ser quem goste de correr de um terminal para o outro e de passar duas vezes pelo controlo de bagagem e de quase perder aviões e de ficar horas à espera do vôo, perante o olhar arrogante e o sorriso pedante dos senhores da Iberia.
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