Passando Badajoz, a caminho de Madrid, chegam terras de nome curioso - de Miajadas a Deleitosa, de Torrecillas de la Tiesa a La Almunia de Doña Godina...
E um haiku em cada mirada:
«Para su seguridad
control
de velocidad»
Mil e tal quilómetros e um dia de viagem depois, a paragem em Lleida faz-se numa tasca aberta para festejar a vitória do Real Madrid. Estranho: é isto a Catalunha?
«É um tirinho, é daqui a Peniche.»
Andorra é um país tão pequeno que só tem uma estrada que atravessa o país de uma ponta à outra, de Espanha a França. Velocidade máxima na única estrada, na tão estreita estrada: 80! Percebe-se: se desse para andar mais depressa, saía-se do país sem se dar por isso...
À entrada no pequeno país, as cidades seguem-se sem acabarem nem começarem - ainda não saímos de uma, já estamos a entrar na outra.
A língua oficial é o catalão. As oficiosas, o espanhol e o francês. Mas aparentemente, a mais falada é... o português! Em cada supermercado, em cada restaurante, em cada paragem, há um português. Diz que é a maior comunidade emigrante em Andorra. Pois: se uma empregada de supermercado ganha 1500 euros e um trolha, 3000...
O Caldea não é bem um spa nem só uma piscina. É um centro termolúdico nascido de um filme sci-fi: por fora parece a torre de Sauron, por dentro é a fortaleza gelada de Super-homem. E, de hora a hora, tem direito a uma Utopia própria.
Há uma dúvida estranha que passa pela cabeça de quem está num jacuzzi ao ar livre, à noite, no meio dos Pirinéus cheios de neve. E não é «que raio faço eu aqui?» É mais «ó mãe, temos mesmo que ir embora?»
E ao terceiro dia, o gozo, a diversão... e a viagem ao Centro Médic. Lá, um enfermeiro saído de um ringue de wresting que fala uma mistura de catalão e francês, decide que a melhor coisa para curar uma parameniscistis é uma espécie de depilação forçada! Para compensar, toma lá uma manga nova para tratar da sinovitis.
No Centro Médic, apesar da simpatia e do profissionalismo, é mais fácil perceber as legendas em latim dos quadros expostos do que a espécie de linguagem que as enfermeiras trocam entre elas.
E quem diz mal das tardes da televisão portuguesa, é porque nunca passou uma tarde a ver televisão espanhola! Duas coisas tem a seu favor: sempre é mais animada e tem a Patrícia Conde...
«Coxo e bêbado, pá. Coxo e bêbado».
A comida de Andorra é uma espécie de mistura entre a boa cozinha espanhola e a nova cozinha francesa. Em restaurantes com nomes como N'Goro N'Goro!
«Olha que há aí cenas mais fixes».
O Supermercat de El Tarter oferece um pouco de tudo a provar: dos melhores enchidos aos licores mais viciantes - dava para jantar. Ao lado, fabrica-se todo o tipo de bebidas alcoólicas e perfumes: desde um vinho do Porto que parece mesmo verdadeiro até ao Chanel mais pomposo a preço de copo de água.
E para a despedida, a neve branqueia a noite. De manhã, nem uma estrada cortada, nem uma rua intransitável. Ainda o sol não nasceu e já os limpa-neves limpam a país.
A viagem entre Andorra e Barcelona faz-se por uma Catalunha perdida, de aldeias da cor da terra e de fábricas em ruínas.
Felizmente, Barcelona continua igual: sempre diferente a cada regresso (a "magna pila" domina agora a Diagonal).
É nas paredes que está o melhor de Barcelona: «La belleza es tu cabeza», diz um graffiti. «Vomita tu ser», diz um outro. «Que es una ciudad?», pergunta outro. «Queremos color», reivindica ainda outro. E toda a Barcelona é uma parede cheia de vida.
O CaixaForum é tudo aquilo que a sede da nossa Caixa Geral de Depósitos podia, aliás, devia ser. Cheio de exposições interessantes e de gente de todas as idades. É uma tarde bem passada. E é de borla!
E é lá que está, até 27 de Abril, «
Chaplin en imatges», uma das melhores exposições sobre cinema que este breviário já viu: emocionante, não só pelas gargalhadas das crianças, mas sobretudo pela comoção dos mais velhos.
Confere: as melhores tapas de Barcelona são no La Flauta, perto da Universidade.
Mais um dia, mais uma viagem: de Barcelona a Zaragoça, a paisagem é quixotesca; daí a Madrid, tem algo de western épico; e até Lisboa, já só cheira a querer chegar. Afinal, 1200 quilómetros num dia não são assim tão longe.
No enorme restaurante La Bodega, nos arrabaldes de La Almunia de Doña Godina, é proibido fumar. Mas há uma pequena sala para fumadores. É na cave. Sem janelas.
«Então e mais filmes? Ou séries, também pode ser séries.»
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